A fé não é fruto de meros conceitos teóricos ou abstratos, e
sim de uma experiência íntima com Deus. Faz parte da nossa história de salvação
e daquela vivida pelo Povo do Antigo Testamento. Daí, para compreendê-la melhor,
é fundamental conhecer bem a Sagrada Escritura. Ela ensina-nos que a
misericórdia é essência do Divino. Outras religiões também reconhecem que Deus
é compassivo e clemente. A Sura Al-Fatiha, primeiro
capítulo do Alcorão, volta-se para tais atributos.
No entanto, isso nem sempre está claro no conceito que se
tem de Deus. Não raro, opõem-se Nele poder e misericórdia, como se fossem
excludentes ou antagônicos. A fé cristã não deve permitir essa dualidade. A
clemência e a compaixão divina ultrapassam a sua justiça. Deus é todo-poderoso,
mas igualmente onipotente no perdão, o qual está implícito em seu julgamento. E
isso é a misericórdia, na concepção bíblica e teológica. Muitos têm uma imagem
errônea e distorcida de Deus, pois o veem como um juiz implacável, quase um
carrasco. Na verdade, Ele é Amor e sua bondade paternal transcende a nossa
imaginação.
O povo da Antiga Aliança comprovou muitas vezes que o Todo
Poderoso punia os culpados, para que voltassem ao caminho da retidão. O Senhor
é “fiel e perdoa culpas, rebeldias e
pecados” (Ex 34,6-7). A justiça divina é pedagógica e deseja levar o homem
a refletir e mudar de vida. Tendo reconhecido o seu erro, arrependendo-se e
comprovando o desejo de conversão, “Javé
se recorda de sua misericórdia” (Sl
25,6).
O Senhor é sensível e benevolente. Esta é uma das
convicções sólidas dos cristãos e dos hebreus. Por volta dos anos 700, antes da
era cristã, o profeta Isaías recordava muitas vezes que Javé “se compadece do seu povo, com misericórdia eterna” (Is. 54,8).
São Paulo emprega frequentemente essa terminologia para
referir-se a Deus, a quem chama de “Pai
de misericórdia e de toda consolação” (2Cor 1,3). Ele é “rico em compaixão e bondade”, pois nos amou,
mesmo sendo pecadores e sem sequer conhecê-lo (Ef 2,4-5). O próprio Apóstolo
dos Gentios confessa ter experimentado a magnanimidade divina, por intercessão
de Jesus, apesar de ter sido blasfemo e perseguidor de Cristo (1Tm 1,13. 16).
O Mestre da Galileia dá-nos a conhecer claramente que seu
Pai é generoso e indulgente, reprovando o farisaísmo e a hipocrisia dos
doutores da lei, que o criticavam porque acolhia os publicanos e comia com os
pecadores. Recordou-lhes as palavras de Isaías: “misericórdia eu quero, e não holocaustos” (Mt 9,13). Beleza,
riqueza e poesia são as parábolas de Lucas (Lc 15), como a do filho pródigo, em
que Cristo mostra a ternura, a benignidade e o perdão do pai: imagem de Deus.
Embora respeite a opção de seu filho, mesmo quando o rejeita e abandona, ele
fica esperando de braços abertos, o seu retorno, pronto para acolhê-lo. E
festeja a sua volta, posto “que estava
morto e tornou à vida; estava perdido e foi encontrado” (Lc 15,32).
O Papa Francisco, em seus pronunciamentos,
leva-nos a refletir sobre o significado das afirmações da fé cristã. Crer em
Deus significa, antes de tudo, confiar em sua inefável clemência, cuja justiça
é muito mais abrangente e complacente que a nossa. Ele quis salvar os homens e
o mundo, não pelo ódio, castigo ou temor, e sim pelo amor e pelo perdão. Ficam
aqui as palavras de Jorge Mário Bergoglio: “Deus
não nos trata conforme a mesquinhez de nossos pensamentos e pecados, mas
conforme a abundância de sua benignidade, seu amor, sua benevolência
incomensurável e seu perdão sem limites”.
Pe. João Medeiros Filho, indigno escravo de amor.
Para citar esse artigo:
Pe. João Medeiros Filho - "Deus é Misericordioso, Clemente e Compassivo"
Fraternidade Discípulos da Mãe de Deus
http://formacaodiscipulosdamaededeus.blogspot.com.br/2013/12/deus-e-misericordioso-clemente-e.html
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